Elas são maioria na prestação de serviços |
Elas também atuam com força no comércio e avançam cada vez mais em profissões que há pouco tempo eram exclusivamente dominadas pelo público masculino |
Wagner Carvalho |
Você consegue imaginar uma profissão onde a figura feminina não se faça presente? Realmente é difícil, seja em menor ou maior proporção, elas avançam, ganham espaços e se destacam em diversas áreas. De acordo com Lilian Azevedo, pesquisadora, professora e doutoranda em história pela Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Assis, as mulheres galgaram posições importantes nos últimos anos e boa parte dessas conquistas está ligada à dedicação aos estudos. Há algumas décadas, as mulheres tinham espaço determinado no mercado de trabalho, sendo a maior parte das vagas ligada à educação ou ao trabalho doméstico. Desde a década de 70 em diante, esse panorama começou a ser alterado. O acesso aos estudos e o desejo de romper alguns paradigmas abriram novos horizontes para as mulheres no mercado de trabalho. Hoje, raramente o preenchimento de uma vaga depende do sexo do candidato, mas, sim, do grau de escolaridade de cada um e nesse quesito as mulheres levam vantagem. Atualmente, a figura feminina se faz presente em todas as áreas do trabalho, do chão de fábrica até a diretoria, dos cargos em instituições públicas até no comércio. Se há 20 anos era difícil imaginar mulheres trabalhando na área da construção civil, hoje, de acordo com levantamento divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 0,6% das mulheres empregadas no País atuam nessa área. O percentual pode parecer pequeno, mas representa milhares de mulheres que literalmente colocam a mão na massa todos os dias pelo Brasil afora. Agnes Mara, 30 anos, é dessas mulheres que conquistou o seu espaço numa função que geralmente é dominada pelo público masculino. Ele trabalha em uma empresa de logística e passa o dia todo dirigindo o caminhão de entregas da empresa. “Eu sempre quis essa profissão, me sinto realizada atrás do volante”, conta. Apesar de não ser casada, a caminhoneira é que tem o maior salário na família. Ela recebe cerca de R$ 1.000,00 mensais e apenas o irmão tem um rendimento parecido. Eliane de Mello também não pode dizer que trabalha em um ambiente tipicamente feminino. Ela atua em uma loja de autopeças há mais de 10 anos. Além de atender no balcão da loja, a funcionária também realiza alguns serviços nos veículos que chegam até a loja. Ao questionar se ela enfrenta algum tipo de preconceito, a jovem conta que não existe e, mesmo que houvesse, não conseguiria atingi-la. Além de Eliane, outras duas mulheres trabalham na autopeças e a gerência da loja também é feita por uma mulher. O que poderia ser estratégia para atrair o público masculino para abastecer seus veículos passou a ser sinônimo de qualidade, bom atendimento e economia. É dessa forma que pensa o gerente de um posto de combustível localizado na Vila Coralina, onde algumas mulheres trabalham com o abastecimento de veículos. “A idéia era oferecer algo diferente. Enquanto a maior parte do estabelecimentos do tipo contratava homens para função, nós resolvemos fazer o que nas grandes cidades já era prática comum, que era contratar mulheres para função”, conta o gerente, que pediu para não ser identificado. “Atingimos um grau de qualidade no atendimento e nos serviços antes nunca alcançado”, relata. Elizabete Cristina de Moura conta que estava desempregada há mais de um ano antes de encontrar vaga no posto de combustível. “Eu queria mesmo trabalhar no atendimento da loja de conveniência, mas fui informada que a vaga já havia sido preenchida e que se eu quisesse poderia fazer um teste como atendente nas bombas de abastecimento”, lembra. Elizabete aceitou o desafio, mas ao chegar em casa os familiares acharam que o serviço era masculino demais. “Mesmo assim, fui em frente. Trabalho no posto há mais de um ano e não tenho reclamações”, afirma. |
07/12/2008 |
Mulheres avançam no mercado de trabalho |
De acordo com pesquisas realizadas por IBGE e Fundação Seade, mulheres disputam quase em igualdade vagas no mercado de trabalho, remuneração ainda é tabu |
Wagner Carvalho |
Foi-se o tempo em que as mulheres eram consideradas o “sexo frágil” ou “a Amélia”. A realidade agora é outra. Elas não abrem mão do trabalho, aliando os papéis de mãe e dona de casa. De acordo com dados da mais recente Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad 2006) divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), as mulheres conquistam cada vez mais espaço no País e em número já são maioria: de cada 200 pessoas do sexo feminino, há 198 do sexo masculino. Em Bauru elas também são maioria, de acordo com a Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (Seade). Dos poucos mais de 357.100 habitantes da cidade, 182.700 são dos sexo feminino e o restante, cerca de de 174.200, corresponde à população masculina. O IBGE também aponta que o número de famílias que têm a mulher como principal referência (responsável ou líder) continua crescendo de forma substancial no País. Em 2006, de acordo com o levantamento, 29,2% dos núcleos familiares tinham a mulher nessa posição. Há 10 anos, essa porcentagem era de 21,6%. Em números, o levantamento mostra que em 1996 eram 10,3 milhões de mulheres indicadas como a pessoas referência da família. No último levantamento, esse número passou para 18,5 milhões. Em suma, em uma década, o número de pessoas do sexo feminino que chefiam famílias quase dobrou, crescendo 73%. E o espaço adquirido pela mulher nos últimos anos no mercado de trabalho é tão nítido que muitas empresas têm optado apenas pela contratação delas para todos os cargos. Max Gehinger, consultor de carreira, garante que o sucesso das mulheres no mercado de trabalho não está relacionado à beleza feminina, mas, sim, à competência das mulheres. Empresas especializadas em recrutamento profissional relatam que nos últimos anos a preferência das empresas por mulheres para preencher os mais diferentes cargos também cresceu. Sônia Teles, gerente de negócios de uma dessas empresas, revela que no último mês, mesmo em tempos de crise mundial, mais de 300 mulheres foram reconduzidas ao mercado de trabalho. “As vagas preenchidas vão desde auxiliar de produção até cargos de chefia”, afirma. De acordo com ela, tal preferência não vem de agora, mas, com certeza, aumentou de forma substancial nos últimos três anos. Para o consultor Davison de Lucas, o mercado de trabalho está atrás de um requisito muito mais presente nas mulheres do que nos homens. “As empresas procuram flexibilidade nas ações e essa qualidade nasce do equilíbrio entre o racional e o emocional, presente com mais força nas mulheres”, afirma. Se quando o assunto é a distribuição de vagas no mercado de trabalho as mulheres seguem os homens de perto, quando o tema é remuneração, as diferenças são visíveis. No início deste ano, o IBGE divulgou que o salário das mulheres trabalhadoras com nível de estudo superior completo correspondia a 60% dos rendimentos pagos aos homens na mesma função. Mesmo com grau de escolaridade mais elevado, as discrepâncias salariais entre os gêneros não diminui. De acordo com o próprio instituto, em média, o rendimento das mulheres incluindo todos os níveis de colocação equivale a 71,3% dos rendimentos recebidos pelos homens. Em São Paulo, o rendimento médio habitual feminino caiu 2,2% nos últimos cinco anos, passando de pouco mais de R$ 1.100,00 para R$1.076,00. “Aqui na nossa região, essa diferença salarial não existe. Sempre que há uma vaga em aberto destinada à contratação de ambos os sexos o salário oferecido se mantém”, garante Gislaine Milena Casula Magrini, analista de recursos humanos. Magrini garante que essa igualdade é registrada em quase todos os níveis de função. “Em cargos de chefia pode ser que haja essa diferença, já que o acerto de o quanto a pessoa irá ganhar é feito entre as partes, mas onde a vaga chega com o salário definido essa diferença não existe”, reforça. Sônia Teles, gerente de negócios de outra empresa que recruta profissionais para o mercado de trabalho, reforça a tese da colega. “Nos últimos três anos o mercado tem aberto muito mais vagas destinadas ao público feminino”, afirma. O IBGE aponta, ainda, que a presença das mulheres no mercado de trabalho é mais forte nos serviços domésticos e na administração pública. Os dados foram divulgados no início deste ano. 22% das mulheres ocupadas no País estão na administração pública, educação, defesa, segurança, saúde e 16,5% nos serviços domésticos. O levantamento aponta que 13,3% das mulheres empregadas estão nos serviços prestados à empresa, na indústria. O número chega a 13,1%, na construção civil, o comércio emprega 17,4% das mulheres ocupadas e 17% desenvolvem funções em outras atividades. Em Bauru, a mulher no mercado de trabalho é encontrada em todas as áreas, mas como a característica do município é prestação de serviço, é nessa função que ela se destaca. |
07/12/2008 - JC nos Bairros |
Elas romperam limites do trabalho no lar |
O trabalho fora do âmbito doméstico aliado ao maior acesso aos estudos promoveu ‘revolução’ feminina, afirma a historiadora Lilian Azevedo |
Que a mulher conquista aos poucos seu espaço no mercado está evidente, mas de acordo com Lilian Azevedo, pesquisadora, professora e doutorando em história pela Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Assis, essa evolução aconteceu de forma lenta e constante, mesmo antes da Segunda Guerra Mundial, e se acentuou após o seu final. Azevedo acredita que as inovações vindas após esse período libertaram a mulher da quase “proibição” que havia de trabalhar fora do ambiente doméstico. Outro aspecto que pesou bastante foi a necessidade da complementação da renda familiar. De acordo com ela, no passado a vida das famílias estava principalmente no campo, onde boa parte do que era consumido era produzido ali. A vida urbana mudou isso, assim como o acesso aos estudos. Leia a seguir os principais trechos da entrevista. Jornal da Cidade – Quais foram as principais evoluções e mudanças geradas pela inserção da mulher no mercado de trabalho? Lilian Azevedo - Ao falar em evolução, já pensamos em algo que melhorou com o tempo, mas não é bem assim. É fato que muitas mulheres conseguiram romper com uma ‘quase’ proibição de trabalhar fora, isso porque no espaço público, fora do lar, acreditava-se que não estariam protegidas. Mas essa ‘lei’ mais ou menos generalizada nas sociedades patriarcais deixou de ter validade e, por isso, muita gente diz que houve uma evolução. Só que pensemos no outro lado da moeda. Mesmo que as mulheres trabalhem fora, de quem “é” a obrigação com as tarefas domésticas e com os filhos, se ela os têm? A partir do momento em que se diz que a obrigação é de um deles, o outro, se fizer algo nesse sentido, será para “ajudar”. Agora, no mercado de trabalho, as mulheres galgaram posições importantes, sim. Pesquisas apontam que elas têm mais tempo de estudos que os homens. Só que o trabalho, de maneira geral, é muito subdividido em inúmeras especialidades. Para aquelas funções em que se tem como importante a racionalidade, o desprendimento de assuntos pessoais, a capacidade de agir com praticidade e criatividade e até uma certa frieza no trato pessoal, ainda os homens são requisitados. Se uma mulher ocupar este cargo, deverá agir “como um homem agiria”. E isso é muito confuso para mim e para muitas mulheres, que não vêem razão em deixar de agir como são em nome de um preconceito. Se elas não fossem capazes, já teríamos percebido! Agora sobre a remuneração, é interessante observar que os ganhos de uma trabalhadora doméstica ou de funções em fábricas que não exijam especialização são infinitamente menores se comparados às funções que ocupam homens com baixa ou nenhuma especialização. JC - Pesquisas realizadas por institutos como IBGE e Fundação Seade apontam que as mulheres avançam sem parar no mercado de trabalho, principalmente nos grande centros. Esse avanço também acontece por aqui? Azevedo - Não sei dizer se essa é a realidade da nossa região. Mas nos cargos de baixa qualificação, sem dúvida, elas estão cada vez mais inseridas. E baixa qualificação não é não ter estudado, mas estar desempenhando uma função para a qual a pessoa não se preparou. JC – As pesquisas também apontam que as vagas de trabalho para o público feminino estão em expansão. Na sua visão, porque isso vem acontecendo? Azevedo - Porque elas estão deixando de ficar em casa e optando por pagar para alguma outra mulher fazer o serviço para elas. Porque elas estão estudando mais para dependerem de si mesmas e até que cheguem na profissão que almejam, muitas têm de pagar os estudos. De que forma? Trabalhando no que for possível. Porque com o número de trabalhadores disponíveis aumentando o valor da mão-de-obra cai. É um pouco a lei da oferta e da procura. JC - Sob o seu ponto de vista, essas mudanças são positivas ou negativas? Azevedo - Difícil dizer. Para mim, não me vejo como dona de casa. Admiro muito quem gosta e vive dessa forma. Não posso falar em nome delas, mas sei de muitas que se queixam de termos chegado a essa precarização do trabalho feminino e do aumento de problemas de saúde pelo estresse gerado devido ao acúmulo de tarefas e responsabilidades sobre as mulheres. JC – Hoje, em muitos lares, as mulheres cumprem o papel de chefes de famílias. Esse fato tende a ser ampliado? Azevedo - Essa mudança foi fruto de um processo histórico. Mas o que manteve os homens como ocupantes das atividades públicas, quero dizer atividades executadas fora do âmbito doméstico, foi uma cultura patriarcal que determinou certas obrigações aos homens e às mulheres, outras, distintas. No caso das mulheres como chefes e provedoras majoritárias, a mudança ocorreu por uma série de fatores. Apontar um apenas não explica corretamente. Mas fiquemos, então, com a crescente urbanização. Cada vez menos pessoas vivendo nas áreas rurais e as cidades com muita gente. No campo, muito do que se consome é produzido lá mesmo. Na cidade, precisamos comprar tudo em mercados e feiras. Para comprar, é necessário dinheiro e para ter dinheiro é necessário trabalhar por conta ou para alguém. Também outros gastos e outras responsabilidades custam dinheiro. Daí fica fácil perceber que mulheres e crianças, por exemplo, passaram a “competir” com os homens os postos de trabalho. JC – Como fica a questão da mulher com seus múltiplos papéis: trabalhar, ser dona de casa, mãe e chefe de família. O que pode a sociedade contribuir para reduzir o atrito entre as diferentes funções? Azevedo - Bem, posso dizer porque faço parte disso! E cada vez mais as mulheres estão assumindo postos de “super-mulher”, porque assim o mercado e a sociedade querem. O problema disso pode ser resumido assim: se mulheres casadas ou não, mas que convivem com homens (filhos, pai, irmãos, namorados) sob um mesmo teto, dividirem a renda familiar, quanto mais elas ganharem tanto melhor será para elas e para todos. Se continuarem a ganhar menos, aumenta a sobrecarga dos homens também, para prover o necessário para a sobrevivência de todos. Se houver eqüidade, em tese, a carga se divide. Se as mulheres continuarem a desempenhar tudo isso, terão, certamente, que dar conta da saúde, que poderá ficar comprometida em muito menos tempo. A saída é a divisão de tarefas a partir do reconhecimento de que dentro de casa ou fora dela vivemos em sociedade e que deve haver equilíbrio. |
Wagner Carvalho
Fonte: Jornal da Cidade / Bauru
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